O lançamento do livro-reportagem “Milicianos: Como agentes formados para combater o crime passaram a matar a serviço dele” (Objetiva, 2023), agendado para hoje às 19h em Botafogo, revela detalhes sobre a relação entre a Polícia Militar (PM) e a expansão das milícias no Rio de Janeiro. O relato de um ex-miliciano, conhecido como Dufaz, expõe a colaboração da PM na invasão de Itaguaí, na Baixada Fluminense, em 2017. O ex-miliciano descreve que antes dos ataques dos paramilitares, policiais militares do 24º BPM entravam nas comunidades fardados e com viaturas, “para espantar os caras”, facilitando a ocupação da milícia.
O depoimento de Dufaz, apresentado no livro, oferece uma visão detalhada da parceria entre as forças de segurança e as milícias. Ele revela que, quando ainda era membro da quadrilha, circulava armado pela cidade usando a farda da PM, mesmo não sendo policial. Nessas situações, os PMs o deixavam seguir normalmente em blitzes do batalhão, até mesmo compartilhando refeições e conversando com os agentes.
Além disso, Dufaz afirma que os PMs vendiam armas apreendidas em operações contra o tráfico para a milícia e entregavam rivais detidos para serem executados pelos paramilitares. Apesar de sua contribuição crucial na condenação de 26 membros da milícia em 2020, Dufaz foi encontrado morto um mês após depor.
O livro também destaca outros casos de colaboração criminosa entre policiais e milicianos. Em 2018, quatro agentes fardados foram fotografados ao lado de paramilitares armados durante uma tentativa de tomar a comunidade do Rola, em Santa Cruz. A imagem gerou uma investigação interna da PM, que concluiu que os agentes permitiram que os milicianos saíssem da comunidade após confronto armado com traficantes.
O plano expansionista da maior milícia do Rio, liderada por Wellington da Silva Braga, o Ecko, a partir de 2017, incluiu invasões em Itaguaí e na favela do Rola. O grupo, fundado por policiais na virada dos anos 2000 e posteriormente tomado por ex-traficantes, estendeu sua atuação por 20 bairros da capital e seis municípios da Baixada Fluminense e da Costa Verde, tornando-se a maior organização criminosa em atividade no Rio.
Apesar das evidências de envolvimento da polícia na expansão da milícia, agentes dos batalhões da região foram premiados por “combater o crime”. O caso de Santa Cruz é emblemático, onde a milícia dominou o bairro, explorando moradores, comerciantes e empresários, e promovendo uma “pacificação” artificial mediante ameaças, extorsões e desaparecimentos de denunciantes. Mesmo com a queda nos homicídios, o 27º BPM, responsável pela região, foi premiado pelo governo estadual por alcançar metas de redução de indicadores criminais.